Todo macho grosseirão é um gay enrustido?
Dizem por aí que todo cara
metido a machão, que vive dizendo que detesta gay, na verdade é um homossexual
enrustido, doido para “soltar a franga”. Será verdade?
Entendo que todo exagero é um
sintoma a ser considerado. Quando vejo alguém contar muitas vantagens,
dizendo-se garanhão ou o mais esperto dos sujeitos, sempre fico a me perguntar
quem lhe convenceu disto. Normalmente, quem precisa dizer que é muito
inteligente, está precisando acreditar nisto. Até porque quem é de fato muito
inteligente, não se preocupa com o que as pessoas pensam de sua inteligência,
está acima disso. O mesmo se aplica para quem se diz “muito macho”. Por que
ficar apregoando por aí que é muito macho? Por que imaginar que alguém
desconfia de sua sexualidade?
Certamente, quem teme sofrer
desconfianças quanto a sua sexualidade, provavelmente também está duvidando de
si mesmo, ou sabendo realmente quem é, mas não querendo que os outros
descubram. Tanto que não é incomum pessoas, geralmente homens, depois de certa
idade e até de família estabelecida com filhos e tudo, descobrir-se e/ou
assumir-se gay! Eu mesmo tenho um amigo que era casado e tinha dois filhos. Ele
tinha um desprezo atroz por sua esposa, a quem considerava burra e ignorante
por excelência. Um belo dia ele a chamou para uma conversa, revelou-se gay,
afirmando que a vida inteira desejou homens, mas que por medo de ser rejeitado
socialmente, envolveu-se com ela. De início ela achou que ele estava inventando
uma história qualquer para se separar e viver com alguma outra mulher. Ele foi
tão convincente por tantos anos, que mesmo ele afirmando ser gay sua esposa
custou a acreditar. Hoje eles estão separados, ele continua sendo um pai
presente e atencioso, mas nunca mais se envolveu com nenhuma mulher. Muitos
amigos dele custaram a acreditar em sua homossexualidade, que foi tão bem
disfarçada por anos. E para quê? Hoje ele continua sendo um profissional
respeitado e procurado por várias empresas, sua família acabou por ter que
aceitar a realidade e agora ele se entende mais verdadeiro para a vida. Foi uma
verdadeira libertação.
Muitos acham que ser macho é
estar sempre pronto para o sexo (seja com qual mulher for), coçar o saco,
cuspir no chão e maltratar os outros. Aí, quando descobrem que ser macho é
simplesmente ser do sexo masculino, se apavoram. Não estou aqui fazendo
apologia da homossexualidade, não. O que estou questionando é o que leva alguém
temer mostrar-se como realmente é e questionar a necessidade que quase todo
mundo tem em se meter na vida alheia, sentindo-se até agredido quanto ao que
seu vizinho, por exemplo, faz em seus momentos de intimidade. Até concordo que
certas demonstrações públicas de carinho são desnecessárias e até agressivas,
mas isto se estende também para os casais heterossexuais. Ou alguém acha que um
homem e uma mulher se “atacando” às claras não poderá chocar ou embaraçar a
mentalidade de criancinhas, por exemplo?
É muito curioso que mesmo
havendo imenso preconceito contra os gays, estes ganham cada vez mais espaço na
sociedade, mesmo onde antes era redutos dos machões, como as escolas de samba e
até mesmo o mundo dos esportes. Tanto que recentemente alguns torcedores
hostilizaram um jogador de vôlei de um time paulista durante uma importante
partida. Logo seus companheiros de time se pronunciaram em defesa do jogador,
que é homossexual, afirmando ser ele um excelente esportista e um amigo
excepcional. Foi uma excelente oportunidade para os preconceituosos machões de
plantão aprender o que é ser gente e cidadão.
Outra coisa que é preciso
desmitificar é que todo gay é promíscuo. Sempre ouço pessoas se referindo aos
gays com desdém dizendo que “fulaninho é gay e só fica dando por
aí!”. Este é o tipo de comentário machista que se assemelha ao
descaso com que alguns homens tratam as mulheres, vendo-as como verdadeiros
depósitos de espermatozoides.
Outra coisa que um machão
detesta é ser chefiado por um gay. Para os machões isto é pior do que ser
chefiado por mulher. Só que esta situação é cada vez mais comum, já que as
estatísticas comprovam que os gays estão estudando mais e não mais aceitando
ser apenas cabeleireiros, costureiros ou maquiadores como era no passado. Hoje
gays executivos são cada vez mais comuns. Cabe até lembrarmos quantos gays se
destacaram e mudaram a história da humanidade: Leonardo Da Vinci, Alexandre (o
grande), Ricardo Coração de Leão (que foi amante do rei Filipe II, da França),
Oscar Wilde e, dizem as más línguas, até Hitler!
Aqui mesmo no Brasil temos gays
que se destacaram em suas áreas de atuação e até na política nacional. Clodovil
e Fernando Gabeira são exemplos. Clodovil destacou-se, ao lado de Dener, a
renovar a alta costura brasileira, que até então seguia piamente o que a Europa
ditava. Já o jornalista Fernando Gabeira, autor do bestseller “O
que é isto companheiro?” e
do emblemático “O crepúsculo do macho”,
escandalizou a sociedade da época quando, ao retornar de seu exílio, foi à
praia usando uma tanga de crochê. O detalhe interessante é que hoje Gabeira tem
uma imensa legião de fãs e eleitores, quase ganhando uma eleição para prefeito
do Rio de Janeiro em 2006 (perdeu por uma diferença de apenas 1,66% para
Eduardo Paes) e para governador do Estado do Rio de Janeiro, em 2010. Pergunto
agora aos deputados Jair Bolsonaro e Marco Feliciano, será que só os gays votam
no Gabeira? Se assim for, quase a metade dos eleitores do Rio de Janeiro são
gays.
Por isso que nos dias de hoje,
discursos homofóbicos como os dos citados deputados são verdadeiros absurdos. É
querer anular uma inquestionável e histórica realidade. E não adianta os argumentos
de que é bíblico não aceitar o comportamento homossexual, porque a vida não é
baseada apenas em conceitos religiosos judaico-cristãos, e sim num apanhado de
princípios, onde a decência, a compostura, a integridade e o amor ao próximo
são componentes essenciais, e que podem e devem ser praticados por todos, homo
ou heterossexuais.
Vivemos num mundo de muitos
abismos econômicos, ideológicos e religiosos, não cabendo mais preconceitos
destrutivos. Discutir e/ou condenar, pura e simplesmente, comportamentos
sexuais, apenas por ser diferente dos supostamente praticados por uma maioria
numérica não é uma atitude inteligente. Quem é de fato inteligente, cuida muito
bem de sua própria vida, deixando a vida dos outros em paz. Até porque, quem
cuida muito da vida dos outros, descuida da sua.
Fonte:http://www.debatesculturais.com.br/
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